A história de Aline
“A gente precisa contar coisas impactantes e íntimas, justamente para sair do normal. A vida e a internet são cheias de futilidade. Às vezes, o que precisamos é de um impacto de coisas reais.” Aline Lebradt
Ela enfrentou o sobrepeso e se tornou influenciadora de emagrecimento
“Me depilar, caminhar mais que uma quadra e até falar, eram coisas difíceis para mim, mas eu normalizava. Chorava e comia mais. Até que eu parei de tomar banho. Foi um dos dias mais assustadores da minha vida. No dia seguinte, eu quebrei o box da cama ao tentar deitar. Eu tive que chegar no fundo do poço para entender que se eu não levantasse e começasse a agir, eu chegaria em um lugar ainda mais fundo do que eu já estava - porque mente quem diz que pior do que está, não fica”.
Esse depoimento, forte e comovente para muitos, retrata a mais pura realidade da vida da cachoeirense Aline Lebradt, 28. Sem romantizar sua condição, dia após dia, ela vem vencendo as barreiras e mostrando ao mundo quem, de verdade, ela é. Hoje, Aline trabalha como modelo plus size e influenciadora digital. Tudo isso porque, um dia, ela decidiu mudar o rumo da sua história e não ser mais uma vítima da obesidade e da depressão.
O início de tudo
Para começar a narrativa da sua vida, Aline conta que sempre foi uma pessoa que amava frequentar a igreja. Mas enxerga, nitidamente, que as coisas começaram a mudar quando ela parou de olhar para Deus e passou a olhar para os outros. Nesse pacote, veio a comparação e a frustração.
“Foi onde a depressão me pegou e eu fui um alvo muito fácil dessa doença. Na igreja, eu tinha um grupo de apoio, amigos e ocupava a minha cabeça. Fora dela eu me isolei, parei com a terapia, não tinha mais amigos e a minha família que deveria ser meu amparo, eu passei a enxergar como inimigos. Eu não tinha mais vontade de sair do quarto sequer para dar um oi ao meu pai. Eu passei de uma menina que tinha um coração amado para alguém armada o tempo inteiro”, lembra.
Aline antes de iniciar o programa de emagrecimento
O sobrepeso
Aline nasceu com quase 4kg e durante a gestação, ficou morta na barriga da mãe. Ela caiu de bicicleta e isso fez com que a placenta se deslocasse, ocasionando o aborto. Aline nasceu com sopro no coração. O seu nascimento, por si só, foi um milagre.
“Mas lidar com o sobrepeso, conforme eu fui crescendo, passou a ser o maior desafio da minha vida. Na escola, bullying de colegas me levava a odiar estudar. Na faculdade, eu tive que desistir porque não conseguia mais passar na roleta do ônibus para ir até o campus da UFSM. No trabalho, fui desqualificada porque a gerência disse que eu não tinha os critérios que eles levavam em conta, de ser fisicamente apresentável”, conta.
Aline está há mais de 13 anos na fila do SUS, esperando por uma cirurgia bariátrica. “As inúmeras tentativas falhas me fizeram ter muitas crises de pânico. Tudo parecia me fazer acreditar que eu morreria doente”, desabafa.
Uma caminhada a passos largos
“Eu via, a cada dia que passava, que eu não tinha mais saúde para brincar com os meus sobrinhos, joelhos para correr, pulmão para rir, não tinha sequer um real para dar um presente a eles. Eu estava só sobrevivendo. Entendi que ninguém estava vindo me salvar ou fazer um milagre por mim. Que só eu era suficiente para mudar a minha história. Essas foram as maiores motivações. A zona de conforto, que de confortável não tem nada, estava me fazendo parar de viver, e parando de viver eu estava escolhendo tirar um pedaço da alegria da minha família”, diz.
Aline entendeu que saúde e estética andam juntas e que tudo funciona como um quebra-cabeça. Melhorando a alimentação, ela melhorou também a sua pele e se livrou das alergias que deixavam seus seios em carne viva. Melhorando a pele, ela melhorou também sua autoestima para começar a se vestir melhor.
Consequentemente, ela também melhorou o seu humor, o que a influenciou positivamente a andar na rua – coisa que ela já estava evitando fazer porque tinha medo de ver pessoas. Ela tinha medo de ser vista. Além disso, com o emagrecimento, ela voltou a menstruar novamente depois de 10 anos. A síndrome do ovário policístico e a pré-diabetes também estão sendo tratadas. “Eu não me depilava mais, pelo fato de não me amar e me detestar o tempo inteiro. Já hoje, como influenciadora digital, faço trabalho para uma empresa de depilação a laser”, conta.
O primeiro beijo a gente nunca esquece
“Eu não era o tipo de adolescente e jovem que era flertada. Então, para me enturmar eu mentia que fazia isso. Aos 21 anos conheci um rapaz e meses depois, quando eu já estava apaixonada e achava que ele também, eu dei meu primeiro beijo. Foi meu primeiro namorado, porém a pessoa que mais me traumatizou na vida. Meu namoro foi feito de traições, humilhações e me fez ter a certeza daquilo que eu sempre achei a vida inteira: eu era feia. Não tivemos um término normal. Em uma viagem da faculdade ele estava tentando ficar com outras colegas na minha frente. E foi o suficiente para eu juntar todas as minhas amarguras e frustrações e desistir da vida. Eu simplesmente saí da igreja, adoeci e me tranquei dentro de um quarto. E foi onde eu comecei a engordar sem parar”.
“Quero de todo coração que isso me dê mais visibilidade e que minha história possa ajudar muitas pessoas que, assim como eu, chegaram a desistir de lutar pela vida”. Aline Lebradt
Primeiro emprego
“Não pude escolher. Aceitei o primeiro emprego em que me aceitaram: em uma fábrica de calçados. Trabalhava 9 horas por dia em pé, com 180kg, em outra cidade. No terceiro dia meu pé simplesmente rasgou o tênis e cheguei em casa com meu pé em carne viva. Eu não queria aquela vida para mim. Obesa e aceitando a ‘primeira coisa que viesse’. Nessa fábrica eu fiquei por 11 meses até a chefia me dizer que eu não teria como ser promovida, como prometeram, porque os critérios que a gerência levava em conta eu não preenchia: ser magra. E foi onde eu voltei a ficar mais uma vez em depressão”.
A visibilidade da internet
Aline diz que sempre soube que, a partir do momento em que ela relatasse na internet seus desafios reais e cotidianos, ela iria conquistar muita gente e impactar centenas de vidas. “Eu comecei a expor minha vida e a mostrar resultados reais. Hoje eu tenho mais de 100 mil seguidores nas redes sociais, grupos de motivação com mais de mil mulheres e trabalho com empresas de todo o Brasil, incluindo a FGH Medicina, Dove e Cerave”.
Mas o cenário nem sempre foi esse. Ela conta que antes de todo esse alcance se concretizar, ela havia tentado apostar no mundo digital. “Oferecia parcerias para médicos e nutricionistas cachoeirenses, e nenhuma porta nunca me foi aberta. Recentemente, fui abordada e estou em acompanhamento com médicos e nutricionistas de outros estados do Brasil. Embora eu tenha sido desacreditada por muito tempo por aqui, eu não desisti de mim”. Hoje, Aline faz acompanhamento com a endocrinologista Juliana Trova, de São Paulo, e com a nutricionista Anna Letícia Costa, do Paraná.
“Também treino na Academia Pró Corpo, aqui de Cachoeira. Criar vínculos de amizade dentro desses locais, que deveriam abraçar pessoas obesas e não fazer elas serem desqualificadas, é muito importante. Muitos obesos são depressivos ou não têm coragem de procurar ajuda por medo do que vão ouvir. Nessa academia eu treino usando top, coisa que nunca achava que eu fosse fazer na vida”, afirma.
“E quando a gente não tem ninguém, inventamos válvulas de escape. As minhas foram a comida e a comparação.”
Aline perdeu 30kg em 4 meses e conquistou muitos seguidores mostrando seu novo estilo de vida
Enfim, o recomeço
“Eu era a pessoa que achava que para ter felicidade, eu precisava já estar onde sonhei. E nesse novo processo, depois de tantas tentativas, eu comecei a compreender que cada grama importa e cada nova conquista também. Que o levantar da cama mesmo estando com muita ansiedade me faz uma vitoriosa no dia de hoje. Que escolher tomar um copo d’água ao invés de refri me faz ser a mais corajosa das mulheres. E isso me faz entender que eu posso influenciar outras pessoas a darem passos de fé e serem responsáveis por eles”, destaca.
Aline conta que já eliminou, de forma natural, 46kg. Ela pesava 179kg e vestia 68 quando decidiu mudar seus hábitos de vida. “Hoje, entrar em um jeans 50 e estar com 135kg me faz enxergar a Aline que achava que só com a cirurgia bariátrica conseguiria ser feliz, ter um emprego e ser digna do amor”.
EDIÇÃO IMPRESSA
BUSCADOR