Mães que valem ouro
A história de luta de seis mulheres que descobriram que seus bebês não eram totalmente saudáveis
Ao engravidar, toda a mulher sonha em ter uma gestação tranqüila e ao fim do parto pegar no colo um bebê cheio de saúde. São nove meses de expectativa, porém ao fim nem sempre esse desejo se torna real. Descobrir que seu filho não é totalmente saudável como o esperado e ainda que talvez precise de acompanhamento por toda a vida não é fácil. Seja logo após o nascimento ou nos primeiros meses de vida, a notícia assusta, mas com coragem elas conseguem superar o choque. Donas de um otimismo incansável, a maioria dessas mães busca recursos para ajudar seus pequenos a crescerem bem e acima de tudo aprendem a vibrar com cada pequeno progresso como uma grande vitória.
O desafio de transformar dor em ação chegou para Maria Cristina Porciúncula, 43 anos, horas após o parto da sua única filha, a Isabelle. “Antes da cesárea senti um pressentimento de que as coisas não seriam como eu esperava. Ainda sob o efeito da anestesia percebi que algo estava errado. Ao contrário do que acontece com as mães não pude ficar com minha filha. Só fui pegar ela depois de mais de três horas, mas não notei nada de diferente. Somente no outro dia, o médico disse que precisava conversar comigo e com meu marido, então veio a notícia: a Isabelle nasceu com síndrome de Down”, relembra, emocionada.
Cristina e Isabelle: síndrome de Down foi diagnosticada logo após o parto
O diagnóstico veio de forma inesperada, assim como a gestação. “Depois de quatro abortos espontâneos e de ter desistido de ter filhos, eu engravidei. Questionei os médicos durante o pré-natal sobre a saúde do meu bebê. Todos os exames foram feitos e nenhum indicava um desfecho desses”, conta. Depois do choque, a primeira coisa que Cristina quis saber era sobre como seria o desenvolvimento da Isabelle. Já no primeiro mês ela começou a freqüentar a Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (Apae) para fazer sessões com fonoaudióloga e estimulação precoce.
“Sempre busquei tudo o que pudesse ajudá-la. No início foi muito difícil, tinha medo do futuro, mas consegui manter o otimismo, sei que ela vai conseguindo superar as dificuldades, tudo no seu tempo”, observa Cristina. Hoje, aos quatro anos, Isabelle mostra sua capacidade de desenvolvimento. Ela caminha desde um ano e um mês, já fala e não usa fraldas desde antes dos dois anos. A menina que deixa a felicidade transparecer no olhar, faz duas vezes por semana estimulação na Apae, freqüenta a Escola de Educação Infantil Favo de Mel e já se prepara para retomar as sessões com fonoaudióloga.
Alegria que se transformou em preocupação
Tudo ia bem no desenvolvimento da pequena Isadhora, até que ao completar um ano e quatro meses a menina começou a ter febre alta. O diagnóstico veio dias depois: ela havia contraído meningoencefalite, uma doença que infecciona as membranas que recobrem o cérebro e o tecido cerebral. A mãe Lidiane Carneiro de Oliveira, 26, lembra dos momentos de tensão vividos durante um mês e uma semana, período que a filha esteve internada na UTI do Hospital de Caridade e Beneficência. “Acompanhei tudo de perto, só vinha para casa a cada quatro dias e mesmo assim por alguns minutos e já retornava para o hospital. Quando ela recebeu alta, os médicos falaram que ela tinha ficado com seqüelas, mas não me disseram o que a doença tinha afetado”, lembra Lisiane.
Ao retornar para casa, Isadhora já não era a mesma criança. A doença tinha atingido as partes do cérebro responsáveis pela fala e pelo aprendizado e por isso ela havia desaprendido tudo o que sabia fazer até antes de ficar doente. “Ela já não falava, não caminhava e voltou a usar fraldas. Fui buscar ajuda e os exames mostraram que ela tinha perdido 30% da audição. Já fiz de tudo por ela buscando a reabilitação. Hoje, com cinco anos, a Isadhora aprendeu a caminhar, mas segue sem falar e ainda usa fraldas”, conta.
Recentemente, mais um choque para Lidiane. Ela descobriu que a filha também sofre de trico-tilomania, uma doença que a faz arrancar os cabelos durante crises nervosas, o que tem causado vários ferimentos em sua cabeça. “Não é fácil lidar com esses problemas, mas eu nunca me desmotivei. Nunca quis saber porque isso estava acon-tecendo justamente com nós. Acre-dito na recuperação da minha filha e vou fazer tudo o que for possível para ver a Isadhora como antes dela ficar doente”, promete Lidiane.
Lidiane: luta para que a filha Isadhora aprenda a falar
Tudo que fazemos vale a pena
A história de alegria da professora Lisiane Freitas D’avila, 36, e seu filho Henrique, hoje com seis anos, também foi interrompida de repente. Com um ano e quatro meses de vida, ele começou a ter em média nove convulsões por dia acompanhadas de paradas cardiores-piratórias. A mãe que já desconfiava de algum problema em razão do atraso no desenvolvimento de Henrique, viu diagnosticado através de vários exames o seu problema: o menino havia nascido com uma desordem genética raríssima.
“Sempre fiz de tudo para contribuir com o desenvolvimento dele e é claro que durante esses cinco anos de luta não fui sempre alegre como estou agora. A vida da minha família mudou muito depois de tudo isso. Aprendemos a viver um dia de cada vez, sempre acreditando que o nosso filho é capaz de superar obstáculos”, observa. Henrique começou a caminhar aos quatro anos e hoje, aos seis, luta para aprender a falar. Sua rotina se divide entre as aulas na Escola de Educação Infantil Guri e Guria, sessões de ecoterapia, fonoaudióloga e apoio pedagógico na Apae. “Tudo o que fizemos vale a pena quando vemos cada pequeno progresso. Teve momentos que a esperança desapareceu, mas graças ao apoio do meu marido, o Valter, da família e dos amigos, consegui superar. Tenho fé que tudo vai ficar bem. Tudo são fases. Queremos muito que ele aprenda a falar, mas se não conseguir, vamos arrumar outro jeito para ele se comunicar e assim vamos levando a vida”, observa Lisiane.
Lisiane: com síndrome rara, Henrique agora tenta aprender a falar
Hora de ir à luta
Deixar de lado a dor de saber que seu filho não é totalmente saudável e ir à luta para amparar a criança. A missão de se voltar exclusivamente para o seu primeiro filho, Ricardo, começou logo que Jane Veiga, 46, deu à luz. Prematuro, o bebê precisou ficar em incubadora por um mês. O alívio após a alta durou pouco. Com nove meses de vida, Jane percebeu que havia alguma coisa estranha. Depois de algumas visitas a médicos, ela procurou um oftalmologista em Porto Alegre que confirmou o que ela temia: o oxigênio necessário quando ele nasceu havia comprometido toda a visão do olho esquerdo e com o direito ele conseguia enxergar somente 20%.
Jane: dedicação integral ao filho Ricardo que identifica apenas luzes fortes
“Saí de lá muito abalada, chorava muito, mas sabia que tinha que me conformar”, lembra. Hoje com 11 anos, Ricardo estuda na quarta série do ensino fundamental na Escola Borges de Medeiros e freqüenta o centro de apoio na Escola Bairro Carvalho. Jane é sua fiel escudeira o acompanhando sempre, até mesmo durante o intervalo na escola. “Minha esperança é que com os constantes avanços da medicina, um dia ele possa ver as belezas do mundo”, projeta.
Sem dúvida se dedicar a uma criança com deficiência é uma missão cheia de desafios e obstáculos, ainda mais quando a mãe precisa dividir a atenção com outros filhos. Assim é a vida de Andréa da Silva Rocha, 33, mãe do Ricardo, 17, José Luís, 12, Carina, 10, Carol, 7, e Kauany, 3. A pequena Carol sofre de paralisia cerebral, problema que atingiu a parte do cérebro responsável pela coordenação motora. “Ela nasceu aos seis meses, pesando pouco mais de um quilo. Depois de dois meses no hospital, ela teve alta. O médico que nos atendia disse que Carol seria uma criança fraca e que precisaria de mais cuidados. Somente quando ela completou um ano e depois de muitas idas ao médico, um neuro-cirurgião diagnosticou a paralisia cerebral”, conta.
Andréa lembra que ficou sem saber o que fazer na hora, mas logo partiu para buscar ajuda. Carol já passou por cinco cirurgias no quadril e nos tendões das pernas e hoje é atendida no Centro Educacional Especializado, faz sessões com fonoaudióloga uma vez por semana e estuda na primeira série da Escola Alarico Ribeiro. “Agora vejo a paralisia de forma diferente. No início vivi fases difíceis, não sabia como lidar, que expectativas poderia criar, não sabia nem se ela iria falar ou enxergar. Hoje sei que muito depende do que fizemos por ela e sei que ela vai progredir, tudo no seu tempo”, observa.
Andréa e Carol: atenção dividida entre a filha com paralisia cerebral e aos outros quatro filhos
Choque ainda na gestação
Ao contrário de grande parte das mães que só descobrem que o filho possui alguma doença ou síndrome somente após o parto, Carla Maus, 29, ficou sabendo que seu primeiro filho, o João Gabriel, era diferente ainda no quinto mês de gestação. Exames apontaram que o menino tinha mielomeningocele, doença que afeta a coluna, e ainda hidrocefalia. Desde o dia do diagnóstico começou a luta para buscar recursos para diminuir o sofrimento do filho. Hoje com quatro anos, João Gabriel já passou por 13 cirurgias, algumas para corrigir os pés e outras para colocar drenos na cabeça. Ele aprendeu a falar desde cedo, porém ainda não consegue caminhar.
“Minha vida é voltada integralmente para ele. Além da fisioterapia, ele faz hidroginástica e em breve vai começar a freqüentar a escola. Os cuidados devem ser constantes, com uso de sonda de três a quatro vezes por dia”, conta. Carla diz que somente agora começou a se recuperar do choque de saber do problema do filho. “Conhecia outra criança com essa doença e o problema afetou o cérebro dela, então quando o médico me falou do João Gabriel, a primeira imagem que veio a cabeça foi dela, que mesmo sendo adolescente não consegue levantar e nem falar. Agradeço por ele não ter tido o cérebro afetado e por conseguir aprender praticamente tudo”, observa. Além da medicação, João Gabriel usa 24 horas por dia um aparelho para firmar as pernas e outro para que os pés não entortem.
Carla: 13 cirurgias marcam os quatro anos de vida do filho João Gabriel
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